A preservação da memória e de seus fatos tangíveis e intangíveis é um dos elementos fundamentais da Cultura. A partir da segunda metade do século XVIII ela se torna mais sistematizada, atraindo gradativamente destaque, interesse, investimento e conformando, a partir do século XX, um campo de conhecimento autônomo e complexo. As demandas e desafios que se apresentam contemporaneamente como problemas para a pesquisa científica e o desenvolvimento tecnológico nesta área, são igualmente complexos, requerendo abordagens plurais, em regime de trabalho e produção por meio de redes interdependentes e colaborativas
A Ciência da Conservação vem construindo, desde o século XIX, um status de instância validadora dos procedimentos de conservação-restauração do Patrimônio Cultural tangível. O campo e hábito da Ciência da Conservação vem se tornando mais claros e definidos à medida que coleções privadas e públicas se tornam mais extensas e organizadas, e se constituem como patrimônio financeiro, determinando a necessidade de pessoas capacitadas para a sua manutenção.
Um marco importante para a consolidação da Ciência da Conservação foi o seminário internacional “University postgraduate curricula for conservation scientists” promovido pelo Centro Internacional para o Estudo da Preservação e Restauração do Patrimônio Cultural (ICCROM) realizado em Bolonha, em 1999, cujo documento resultante conclui que
O(a) cientista da conservação pode ser definido(a) como um(a) cientista com formação em ciências naturais, físicas ou aplicadas e com conhecimento adicional em conservação (ética, história, valores culturais, história da arte técnica, técnicas e práticas de conservação do passado e do presente e outros aspectos científicos específicos) que lhe permitem contribuir para estudo e conservação do patrimônio cultural em uma equipe interdisciplinar.
O termo Ciência do Patrimônio passou a ser mais frequentemente utilizado a partir de 2006, quando o Comitê de Ciência e Tecnologia do Parlamento Britânico propôs o seu uso para denominar um campo científico mais amplo, configurando uma expansão da Ciência da Conservação.
Estariam aí contidos todos os aspectos da pesquisa realizada pelos cientistas da conservação, realizada em instituições museais, universidades e institutos de pesquisa, abrangendo não somente a investigação dos aspectos físicos e materiais que dão suporte à Conservação-Restauração, mas também a gestão, registro, documentação e interpretação do Patrimônio Cultural. O documento detalha e compara a situação britânica com a europeia e com a norte-americana em termos do número de profissionais envolvidos com a preservação do Patrimônio Cultural e a proporção de cientistas entre eles.
Como desdobramento desse documento foi criado no Reino Unido o Fórum Nacional de Ciência do Patrimônio, que disponibiliza, em seu website uma série de publicações com detalhes da política britânica de preservação, cabendo destacar a publicação Our Vision and Strategy for Heritage Science, segundo a qual
A Ciência do Patrimônio é um campo de trabalho que faz a ligação entre as Ciências Humanas e Naturais. Ele amplia a compreensão e valorização do Patrimônio Cultural por parte das pessoas independentemente da sua idade, e é um daqueles temas híbridos que envolve as pessoas com essas disciplinas. Seja por meio do uso ou do desenvolvimento científico que auxilia a entender, gerenciar e comunicar a História, expressa através de paisagens, edifícios e artefatos a Ciência do Patrimônio incentiva a colaboração e o reforço mútuo entre as Ciências Humanas e Naturais.
Uma importante iniciativa internacional embasada neste conceito é a Plataforma Europeia Integrada de Infraestrutura de Pesquisa do Patrimônio Cultural, o consórcio IPERION-CH, financiado pelo programa Horizon 2020da União Européia. Dentre outros objetivos, o IPERION visa a criação de redes para compartilhamento de infraestruturas de pesquisa voltadas para a Conservação-Restauração do Patrimônio Cultural, como por exemplo a E-RIHS – European Research Infrastructure for Heritage Science.
Em editorial recente, destacado no website da E-RIHS, o Prof. Matija Strlic do University College London discute o significado do termo, apresentando-o como um “guarda-chuva que abrange a Ciência da Conservação, Ciência Arqueológica e Ciência da Construção”.